Quando cabe liberdade provisória com fiança?
Tema atualizado em 28/2/2023.
“2. De acordo com o art. 326 do Código de Processo Penal, ‘para determinar o valor da fiança, a autoridade terá em consideração a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento’.
3. A impossibilidade de arcar com a fiança estipulada deve ser demonstrada e não apenas alegada, mormente quando se depara com indícios em sentido contrário. Hipótese dos autos.
4. Considerando, no caso, o elevado prejuízo da vítima e a existência de indícios de ter a paciente auferido considerável proveito econômico mediante o golpe perpetrado, a fiança só cumprirá seu papel se fixada em valor suficiente para assegurar eventual indenização.”
Acórdão 1659563, 07400352320228070000, Terceira Turma Criminal, data de julgamento: 2/2/2023, publicado no PJe: 10/2/2023.
“Sabidamente, e conforme o artigo 321 do Código de Processo Penal, ausentes os requisitos da prisão preventiva, o juiz concederá a liberdade provisória, impondo, se o caso, uma ou algumas das medidas cautelares previstas no artigo 319, observados os critérios do artigo 282.
Na espécie, o paciente ostenta passagem pela Vara da Infância e da Juventude, pela prática de ato infracional análogo a latrocínio. Alcançada a maioridade, continuou a delinquir, tendo sido condenado pelo crime de roubo (sentença ainda não transitada em julgado). Tais circunstâncias confirmam a razoabilidade e a proporcionalidade do valor da fiança fixado, no importe de R$3.000,00 (três mil reais), para mitigar a continuidade delitiva.
De outra parte, a situação econômica do paciente tem de ser aferida dos elementos constantes nos autos. Ocorre que a Defesa não juntou elementos que demonstrem a hipossuficiência do acusado ou a impossibilidade de arcar com a fiança estipulada.
Assim, observado o preceito do artigo 326 do Código de Processo Penal (a natureza da infração, as condições pessoais de fortuna e vida pregressa do acusado, as circunstâncias indicativas de sua periculosidade, bem como a importância provável das custas do processo, até final julgamento), é razoável, em linha inicial, o valor arbitrado pelo juízo. Ressalta-se que a fiança tem de implicar ônus financeiro para o afiançado, caso contrário não atenderia às finalidades de assegurar o comparecimento aos atos processuais, de inibir a prática de novos ilícitos penais e de garantir indenização à vítima em caso de condenação”
Acórdão 1183828, 07091096420198070000, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 4/7/2019, publicado no DJE: 10/7/2019.
Acórdão 1301115, 07455241220208070000, Primeira Turma Criminal, data de julgamento: 12/11/2020, publicado no PJe: 23/11/2020;
Acórdão 1197768, 07156658220198070000, Segunda Turma Criminal, data de julgamento: 29/8/2019, publicado no PJe:
Quando a liberdade provisória pode acontecer com ou sem fiança?
Liberdade provisória x relaxamento da prisão x revogação da prisão
A liberdade provisória pode ser concedida, com ou sem fiança, no caso de prisão em flagrante, em que o procedimento não tiver nenhuma violação das normas previstas em lei, conforme o artigo 310, inciso III do Código de Processo Penal. Apesar da prisão ser legal, o magistrado pode entender que não é mais necessária para o procedimento criminal e, assim, determinar a liberdade provisória.
O relaxamento da prisão ocorre nas hipóteses de prisão preventiva, que sofreu algum tipo de ilegalidade, ou não possui os requisitos para sua decretação.
A revogação da prisão cabe tanto para prisão preventiva quanto para a prisão temporária, que ocorreram dentro da legalidade, mas que não são mais úteis para o processo criminal.
Veja também:
FIANÇA
PRISÕES CAUTELARES
Código De Processo Penal – Decreto -Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
- relaxar a prisão ilegal; ou
- converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou
- conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.
Parágrafo único. Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.
Art. 322. A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.
Parágrafo único. Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.
Quando a pessoa não tem como pagar a fiança o que acontece?
O não pagamento da fiança libertadora pelo agente abastado tem como consequência a concessão judicial da liberdade provisória sem fiança; 2ª) esta liberdade provisória, para ser aplicada de forma justa e adequada (proporcional, razoável etc.), deve vir cumulada com medida (s) cautelar (es) restritiva (s), especialmente …
O que é liberdade provisória e qual o seu fundamento legal?
A liberdade provisória tem fundamento na Constituição Federal (em seu artigo 5º, inciso LXVI), que estabelece que ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança. A liberdade provisória é uma medida de contracautela. O agente é colocado em liberdade se a lei expressamente autorizar. Essa medida é aplicável sempre que estamos diante de uma prisão em flagrante legal, mas desnecessária. Diferentemente do caso de prisão ilegal (flagrante ou preventiva), em que o instituto de contracautela aplicável é o de relaxamento da prisão, e do caso de prisão preventiva legal, mas desnecessária, em que o instituto aplicável é a revogação da prisão.
A nossa constituição prevê crimes inafiançáveis, como o de racismo (art. 5º, XLII, CF) e os crimes hediondos e equiparados (art. 5º, XLIV, CF). Estes crimes não admitem a concessão de liberdade provisória com fiança. Todavia, não possuem impedimento para concessão de liberdade provisória sem fiança.
O Código de Processo Penal prevê a possibilidade de vedação da liberdade provisória quando o agente é reincidente, ou ainda quando ele integra organização armada ou milícia, ou quando tem porte arma de fogo de uso restrito, nos termos do artigo 310, §2º:
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: (…)
§ 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares.
Atenção! É possível haver declaração de inconstitucionalidade deste dispositivo. Há decisões do Supremo no sentido de que não é possível vedar a liberdade provisória em abstrato. Isto é, sua aplicação deve ser analisada pelo juiz no caso concreto. Então, há chances deste dispositivo ser considerado inconstitucional.
Como citado anteriormente, é possível a concessão de liberdade provisória mediante o pagamento de fiança, que, na definição de Guilherme Nucci, é uma “garantia real, consistente no pagamento em dinheiro ou na entrega de valores ao Estado, para assegurar o direito de permanecer em liberdade, no transcurso do Processo Criminal”
O pagamento da fiança possui duas finalidades distintas, quais sejam:
- Garantir a presença do acusado no processo;
- Assegurar a aplicação da lei penal, quando necessário.
Há a possibilidade de concessão de liberdade provisória sem fiança, sendo ainda o delegado capaz arbitrá-la nas infrações cuja pena máxima em abstrato não seja superior a 4 anos (art. 322, CPP).
O artigo 323 do Código do Processo Penal traz algumas hipóteses em que é vedada a concessão de liberdade provisória mediante pagamento de fiança, algumas delas repetindo a disposição constitucional. Vejamos:
Art. 323. Não será concedida fiança:
I – nos crimes de racismo.
O que acontece depois da liberdade provisória?
A liberdade provisória, depois de concedida, durará até a sentença penal condenatória. Sendo considerado culpado, o agente será preso, do contrário, ou seja, sendo absolvido pela sentença, o indivíduo permanecerá em liberdade, sem qualquer tipo de restrição.
O que acontece quando o réu não tem condições de pagar fiança?
Quando o acusado não tiver condições de pagar a fiança, a manutenção da prisão preventiva configura constrangimento ilegal. Com esse entendimento, a presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministra Maria Thereza de Assis Moura, concedeu liminar em Habeas Corpus para reduzir o valor da fiança fixada para um médico acusado do crime de lesão corporal culposa na direção de veículo.
A prisão preventiva do médico foi revogada pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que, entretanto, condicionou a sua libertação ao recolhimento do valor estipulado.
Em sua decisão, a ministra Maria Thereza seguiu a jurisprudência do STJ, que considera constrangimento ilegal manter a prisão preventiva unicamente pela falta de pagamento da fiança, quando há indícios de que o acusado não tem condições econômicas de fazê-lo.
Acusado em outros processos
O médico responde a duas outras ações penais, a primeira por crime de lesão corporal no trânsito, em razão de fato ocorrido em janeiro de 2017, e a segunda, já com condenação em grau de recurso, por homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção de veículo, que teriam ocorrido em novembro daquele ano. Todos os delitos teriam sido praticados sob a influência de álcool.
Em junho deste ano, ele foi preso novamente, sob a acusação de ter cometido mais um crime de lesão corporal culposa na direção de veículo, também sob a influência de álcool. Diante disso, o juízo de primeiro grau converteu o flagrante em prisão preventiva, por entender que as medidas diversas da prisão anteriormente impostas não se mostraram suficientes para impedir a prática de novos delitos da mesma natureza.
Contra essa decisão, a defesa impetrou Habeas Corpus, o qual foi parcialmente deferido pelo TJ-MS para substituir a prisão preventiva por outras medidas cautelares, com a imposição de fiança no valor de 100 salários mínimos. No Habeas Corpus impetrado no STJ, a defesa alega que o médico não tem condições econômicas de arcar com a fiança arbitrada, correspondente a R$ 132 mil, valor que seria exorbitante e não condizente com a sua renda mensal, inferior a R$ 8 mil.
Prisão abusiva
A presidente do STJ destacou que o encarceramento preventivo do acusado apenas perdura em razão do não recolhimento da fiança arbitrada – situação rechaçada pela jurisprudência, conforme precedentes mencionados na decisão.
Segundo um desses julgados, não é razoável manter o réu preso cautelarmente apenas em razão do não pagamento da fiança, especialmente quando se alega impossibilidade de fazê-lo e estão ausentes os requisitos da prisão preventiva exigidos pelo artigo 312 do Código de Processo Penal.
O mérito do Habeas Corpus será analisado pela 5ª Turma, sob a relatoria do desembargador convocado João Batista Moreira.
Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
HC 839.235.
É possível a liberdade provisória para crimes inafiançáveis?
Portanto, nos crimes inafiançáveis, só pode ser concedida a liberdade provisória quando não está presente o fumus boni iuris, ou seja, quando não há prova da existência do crime ou quando não há indício suficiente da autoria.
Quando não é cabível a liberdade provisória?
A legislação brasileira determina expressamente, no Código de Processo Penal, os crimes que não aceitam o pagamento de fiança para conceder a liberdade provisória. São inafiançáveis: racismo, tortura, tráfico de drogas, terrorismo.